Dr. Claudio M. Martins

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Criança com agenda cheia não é sinônimo de adulto bem-sucedido




Em tempos de tantas dúvidas sobre a educação dos filhos, o inglês Carl Honoré, também pai, reflete sobre os perigos de se manter um comportamento obsessivo e cobrador em relação à educação das crianças. No livro Sob Pressão (Editora Record, R$ 49), que acaba de chegar às livrarias brasileiras, ele mostra, por meio de pesquisas e opiniões de especialistas, como a preocupação excessiva dos pais com o desempenho dos filhos coloca as crianças numa posição que não é a delas. Com a agenda cheia de fazer inveja a altos executivos, elas perdem a oportunidade de encontrar por si mesmas seus verdadeiros interesses e talentos. Muitas são obrigadas, por exemplo, a fazer aulas de pintura porque seus desenhos obtiveram elogios da professora.

"As crianças que são muito ocupadas e organizadas podem acabar menos criativas. Elas não têm o tempo ou o espaço para explorar o mundo em seus próprios termos, para aprender a correr riscos e a cometer erros", disse ele em entrevista concedida ao Terra por email.

Terra - É mais difícil educar as crianças hoje em dia?
Carl Honoré -De certa forma, a resposta é sim. Vivemos em uma cultura baseada na competição, elevando as expectativas e a impaciência. Queremos que tudo seja perfeito e agora. Isso coloca uma enorme pressão sobre os pais para criar um superfilho. A proximidade da fronteira entre as gerações também criou incerteza sobre como criar filhos. Esta geração de pais quer ficar jovem para sempre - vamos ouvir a mesma música, usar a mesma roupa, falar a mesma gíria, como nossos filhos. Isso deixa menos espaço para as crianças se definirem. E também torna mais difícil para nós, como pais, impor disciplina.

Mas nem tudo é má notícia. Há também muitas vantagens para crescer no início do século 21, especialmente na classe média. As crianças são menos propensas a sofrer de desnutrição, negligência, violência ou morte do que em qualquer momento da história. Estão rodeadas por confortos materiais que seriam impensáveis há uma geração atrás. Legiões de acadêmicos, políticos e companhias estão se esforçando para encontrar novas maneiras de cuidar, alimentar, vestir, ensinar e entretê-las. Seus direitos estão consagrados no direito internacional. A internet é uma fronteira extremamente excitante e nova para aprender e jogar. Os pais são muito mais emotivos com seus filhos do que nunca. Famílias estão menos autoritárias do que costumavam ser.

Terra - Uma criança muito ocupada, com uma agenda cheia de atividades, é conveniente para os pais. Mais tarde, quando ela crescer e se der conta, qual o resultado?

CH - As crianças que são muito ocupadas e organizadas podem acabar menos criativas. Elas não têm o tempo ou o espaço para explorar o mundo em seus próprios termos, para aprender a correr riscos e a cometer erros. Elas não aprendem a pensar por si mesmas, apenas fazem o que é dito. Também não aprendem a olhar para dentro de si e descobrir quem são, já que estão muito ocupadas tentando ser o que nós queremos que elas sejam. E ainda: não aprendem a usar o tempo ou como preencher o tempo por conta própria - assim se cansam mais facilmente e podem sofrer de estresse e exaustão. As crianças que tiveram cada momento de sua vida gerida, organizada, controlada e programada pelos adultos, terão mais dificuldades de andar com seus próprios pés mais tarde. Em outras palavras, elas nunca crescem. É por isso que os estudantes universitários estão sofrendo problemas de saúde mental em números recordes.

Terra - Hoje os pais buscam receitas mágicas para educar, tanto que há inúmeros manuais desse tipo nas livrarias. Eles funcionam ou seria mais interessante seguir os instintos paternos?

CH - Não existe uma fórmula mágica para criar filhos. Cada criança é única e cada família é única. O segredo é encontrar a fórmula, o estilo de paternidade que funciona melhor para você e seus filhos - e não seguir exatamente o que todo mundo está fazendo. O problema é que os pais de hoje são oprimidos por uma avalanche de conselhos, advertências e opções -e não sabem o que fazer. E quando não sabemos o que fazer a nossa resposta é muitas vezes apenas fazer o que todo mundo está fazendo.

Eu escrevi Sob Pressão para recuperar a minha própria confiança como pai e ajudar os outros a fazer o mesmo. Pais confiantes são capazes de resistir ao pânico e à pressão dos demais, a fim de encontrar sua própria maneira de educar os seus filhos. Acho que manuais para os pais às vezes podem ser úteis. Mas se você usá-los em demasia, eles podem acabar minando a sua confiança, de modo que você sinta que não pode fazer nada sem antes consultar um manual ou um especialista.

Terra - É comum ouvir que a criança deve aprender brincando. O que significa isso?

CH - A brincadeira é um impulso básico para as crianças. E quem passa o tempo com as crianças sabe disso. Brincar permite que elas criem mundos imaginários onde podem enfrentar os medos e ensaiar papéis adultos. Como os cientistas, elas arriscam as teorias sobre o mundo. Brincar em grupos sem executar o programa dos adultos ajuda as crianças a aprender a lidar com os sentimentos das outras pessoas e com a frustração. Basta assistir a um casal de crianças de três anos construindo uma casa de varas no jardim. Elas reúnem o material, negociam como montá-la, inventam regras, disputam o que cada uma coloca e onde. Crianças que brincam livres também começam a descobrir os seus próprios interesses e paixões, forças e fraquezas. A brincadeira é também uma versão natural do mais estruturado sistema de aprendizagem que ocorre na sala de aula e ajuda a estabelecer as bases para a leitura, a escrita e a aritmética. Como Maria Montessori (educadora italiana que criou o método pedagógico montessoriano) afirmou: "Brincar é o trabalho de uma criança."

Terra - Tanta ambição e monitoramento em cima dos filhos podem ser negativos para as crianças. Mas deixá-los "livres" para aprender seria a solução?

CH - É necessário equilíbrio. Uma parte importante da função dos pais é incentivar seu filho a ser ambicioso, para tirar o melhor dele, para cumprir o seu potencial. As crianças também precisam de limites para se sentir seguras - e ter algo para desafio. Mas isso é apenas uma parte da questão. A liberdade de aprender, de explorar o mundo em seus próprios termos é também essencial. A criança estará sempre melhor quando aprender a seguir o seu próprio interesse ou paixão, ao marcar o seu próprio caminho - e não apenas seguir o mapa estabelecido por outras pessoas.

Em todo o mundo, os alunos estão abandonando os seus estudos universitários no primeiro ano em números recordes. Por quê? Porque, pela primeira vez em suas vidas estão longe de casa e livres para pensar sobre o que eles querem fazer com suas vidas. E estão percebendo que, de repente, seguindo o caminho traçado por seus pais ou outras pessoas, eles terminaram no curso de graduação errado. Não querem ser advogados, e sim arquitetos. Não querem estudar medicina, e sim engenharia. Dar às crianças a liberdade de aprender mais cedo na vida iria ajudá-las a não cair no caminho errado.

Terra - Colocar crianças para aprender línguas, trabalhar em grupo, praticar esportes competitivos e outras tarefas que fazem do mundo adulto tão cedo pode ter resultado inverso? Qual seria a idade mais adequada para começar os cursos extracurriculares?

CH - Novamente é tudo uma questão de equilíbrio. Devemos dar aos nossos filhos uma experiência rica de mundo e encorajá-los a aprender e experimentar com muitas atividades diferentes. O problema começa quando vamos longe demais, quando se estrutura e organiza todos os momentos da vida de nossos filhos. É difícil dizer exatamente o tempo ideal para iniciar atividades extracurriculares. Cada criança é diferente. Mas, em geral, eu acho que não há necessidade de atividades organizadas quando têm idade entre 0 e 5 anos. Não há problema em colocá-las em talvez uma ou duas atividades, mas não é preciso. Elas não vão sofrer se não estiverem em atividades nessa fase. Na verdade, irão se beneficiar de brincar livremente.

Terra - Existe uma nova linha de ensino ou de tendência hoje em dia nas escolas?

CH - Na maioria dos países, os sistemas de educação ainda são orientados para o modelo do século 19: preencher o tempo das crianças com informação, e, em seguida, testá-las mais e mais. Isso é completamente inútil no século 21. Precisamos de escolas que cultivem a criatividade. A boa notícia é que a mudança está chegando. Em todo o mundo, os sistemas escolares estão começando a reduzir a obsessão com os exames e estão diminuindo a carga de trabalho acadêmico e descobrindo que, quando os alunos têm mais tempo para relaxar, refletir e tomar conta de sua própria aprendizagem, eles aprendem melhor. No ano passado, Toronto (Canadá) tornou-se a primeira cidade da América do Norte a reduzir a lição de casa em todos os níveis. Cargilfield, uma escola privada, na Escócia, proibiu totalmente a lição de casa para alunos de 3 a 13 anos. Dentro de um ano, as notas de exame em matemática e ciências aumentaram quase 20%.


Especial para Terra

Data: 14/10/2009 - 16:18
Fonte:: Terra


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